missões

Peru: crescimento evangélico indica mudança histórica no país

em

O cenário religioso do Peru passa por uma transformação significativa, marcada pela retração da presença católica e pelo crescimento consistente do movimento evangélico. Dados do Instituto de Estudos Peruanos (IEP), divulgados em maio de 2025, mostram que o percentual de peruanos que se identificam como católicos caiu de 63,5% para 60,2% entre novembro de 2024 e maio deste ano. No mesmo período, a proporção de evangélicos aumentou de 8,4% para 11,3%.

A pesquisa integra uma série de levantamentos que apontam para uma mudança mais ampla e de longo prazo. Em 1996, apenas 4,4% da população se declarava evangélica; hoje, esse número é estimado em cerca de 20%. O dado indica uma transição gradual, mas profunda, na paisagem religiosa nacional.

Segundo especialistas consultados pelo IEP, parte da queda da adesão católica está relacionada a escândalos envolvendo a instituição. Um dos casos de maior impacto foi a dissolução definitiva do Sodalitium Christianae Vitae (SCV), associação católica fundada em 1971 e formalmente desfeita em abril de 2025, por ordem do Vaticano. A decisão veio após décadas de denúncias de abusos físicos, psicológicos e sexuais, envolvendo membros da organização. Apesar de sua influência política e econômica, o SCV passou a ser percebido como um grupo elitista e desconectado da realidade popular.

Outro episódio de repercussão foi a denúncia de abuso sexual contra o cardeal Juan Luis Cipriani, ex-arcebispo de Lima e membro do Opus Dei. O caso remonta a um suposto crime cometido em 1983 contra uma menor, tornado público no início de 2025, abalando ainda mais a imagem da Igreja Católica no país.

A teóloga Veronique Lecaros, professora da Pontifícia Universidade Católica do Peru, afirma que o afastamento dos jovens da religião institucional não significa necessariamente rejeição à fé. “Muitos universitários não são ateus, mas se distanciaram da religião por frustração com o que ela representa institucionalmente”, declarou à imprensa local.

Apesar disso, os números relativos aos que não professam fé mostram variações modestas. O grupo sem filiação religiosa aumentou de 11% para 12%, enquanto os que se declaram ateus ou agnósticos caíram de 2% para 1%. A expansão evangélica, portanto, não resulta da secularização, mas de uma migração religiosa interna, em grande parte motivada por rupturas com estruturas eclesiásticas tradicionais.

Além do campo espiritual, os evangélicos têm ampliado sua presença na esfera pública. Parlamentares como Milagros Jáuregui de Aguayo e Alejandro Muñante têm se destacado no Congresso Nacional com pautas ligadas à defesa da família, proteção da infância, saúde pública e atenção às comunidades indígenas. Segundo o portal Evangelico Digital, o fortalecimento político é visto como reflexo da consolidação social do movimento evangélico — e, ao mesmo tempo, um de seus fatores de crescimento.

O processo vivido no Peru espelha tendências observadas em outros países da América Latina, como Brasil, Guatemala, Argentina e Chile, onde o avanço evangélico também provocou reconfigurações profundas no cenário religioso. No entanto, o catolicismo permaneceu hegemônico no Peru por mais tempo, o que torna a transição atual um ponto de inflexão.

A filósofa Cecilia Tovar, do Instituto Bartolomé de las Casas, destaca que os dados refletem uma trajetória anterior aos escândalos mais recentes. “A eleição do novo arcebispo, por exemplo, ainda não foi absorvida pela opinião pública. Levará tempo para vermos os efeitos disso nas próximas pesquisas”, afirmou.

O futuro da configuração religiosa no Peru segue em aberto, mas os dados sugerem que os evangélicos caminham para ocupar espaços antes dominados quase exclusivamente pelo catolicismo, em um movimento que mescla fé, engajamento social e presença institucional crescente.

Trending

Sair da versão mobile