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História – Calvino e Servetus

História de João Calvino e Michael Servetus

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Quero fazer um “parênteses” em nossas reflexões e estudos teológicos, e contar uma triste, mas importante, história aos nossos leitores. Fatos que não devem ser jamais repetidos, e que muitos pensam que, nos dias atuais, estamos imunes, livres de radicalismo “cristão”, por crer que prevenir é sempre uma boa medida, postarei, narrações de fatos que ocorreram ao longo da história da Igreja Cristã.

Um dos capítulos mais obscuros da época reforma protestante, século XVI, foi o episódio ocorrido entre o reformador João Calvino e Michael Servetus. Este, um homem de ensinos bíblicos distorcidos, entre eles negava a doutrina da trindade, e que foi condenado à morte por isto, e por desafiar teologicamente (tecendo comentários a respeito das Institutas da Religião Cristã) a João Calvino.

Interessante é que João Calvino foi considerado por muitos em sua época, e posteriormente, inclusive por este autor, como alguém de ensinos contrários as Escrituras, mas a sua influência política em Genebra o ajudou a expulsar seus opositores da cidade.

A narrativa abaixo expressa, com riqueza de fontes, que a igreja protestante “Reformada”, em Genebra e em toda Europa, liderada por Calvino e Theodor de Beza, também condenava homens à fogueira e ao afogamento, e pior, tal postura não causava qualquer espanto.

(o Rio Danúbio foi o lugar do afogamento daqueles que se negavam batizar seus filhos recém-nascidos, movimento que foi chamado de anabatista, que significa “rebatismo”, uma vez que criam que o batismo Cristão genuíno deveria seguir a conversão, ao arrependimento, e não anterior a estes).

Não vejo porque ocultar isto de alguém, ou não tratar a questão, se a Bíblia não esconde os erros, por exemplo, de Abraão, Sansão, Jacó, Davi…

O texto não é nosso, mas espero que seja útil e gostem.

Graça e Paz.

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Do Livro de Laurance M. Vance, “O Outro Lado do Calvinismo”.

 

Calvino e Servetus

O assunto de uma teocracia igreja-estado em Genebra e a intolerância que veio com ela nos levou ao que tem sido chamado “o capítulo negro na história de Calvino, que tem obscurecido seu nome íntegro, e o tem exposto, não injustamente, à acusação de intolerância e perseguição.”[1] Esta mancha na história de Calvino tem sido deturpada e calvinistas zelosos dão satisfações para proteger sua reputação. Warfield insiste que “Calvino possuía pouca influência no tribunal que condenou e executou Servetus.”[2] Henry Cole, o tradutor de duas das obras teológicas de Calvino, sustenta que “Calvino é falsamente dito ter sido o conselheiro proeminente” no caso da morte de Servetus.[3]

Kuyper acusa que “a história tem sido culpada da enorme injustiça de expor esta execução de Servetus na fogueira.”[4] Philip Hughes argumenta que “Servetus não foi queimado por Calvino, que não tinha nenhuma autoridade para pronunciar, ou até para votar, tal sentença.”[5] Alister McGrath lamenta que Calvino tem sido isolado enquanto as “maiores alegações de infâmia de outros indivíduos e instituições” têm sido deixadas de lado.[6] Não há necessidade de dizer mas a veracidade destas declarações resta ser provada.

Michaelem Serveto, conhecido por nós como Michael Servetus, nasceu em 1509 ou 1511,[7] em Villanueva, em Aragon, Espanha. Conseqüentemente, ele era praticamente da mesma idade que Calvino e, como ele, foi criado como um católico romano. Foi educado na Universidade de Saragossa, e mais tarde estudou Direito na Universidade de Toulouse.[8] Embora Servetus foi por vários anos empregado de Juan Quintana, o confidente do Sacro Imperador Romano Charles V,[9] ele se apresentou na protestante Basel em 1530, onde encontrou o reformador John Ecolampádio.[10] Aqui ele publicou dois ataques à Trindade, Seven Books on Errors about the Trinity, em 1531, e Two Books of Dialogues on the Trinity, em 1532.[11]

Depois que seus livros foram julgados heréticos, Servetus assumiu o nome de Michel de Villeneuve e foi para Paris estudar matemática, geografia e medicina.[12] De Paris ele se transferiu para Lyons e editou uma edição da Geography de Ptolomeu e escreveu alguns tratados sobre medicina e astrologia.[13] Servetus retornou para Paris em 1536, se formou em medicina, e dava palestras na universidade sobre geografia e astrologia.[14] Aqui ele publicou mais duas obras: um estudo sobre o uso de xaropes na medicina, em 1537, e uma obra sobre astrologia, Apologetic Dissertation on Astrology, em 1538.[15] Foi aqui que ele também descobriu a circulação do sangue pulmonar, anos antes de William Harvey (1578-1658).[16]

Após os conflitos em Paris acerca de seus ensinos sobre astrologia, Servetus deixou Paris para praticar medicina e, algum tempo depois de 1540, acabou em Vienne, um subúrbio de Lyons.[17] Aqui ele tanto praticou medicina quanto editou livros. Uma segunda edição da Geography de Ptolomeu apareceu em 1541, uma edição da Bíblia Latina de Pagnini em 1542, e uma edição em sete volumes da Bíblia.[18] Obviamente, Servetus era muito culto e extremamente inteligente. Schaff conta que ele conhecia seis línguas.[19]

Servetus devia passar treze anos em Vienne. Por causa de suas crescentes opiniões religiosas não-ortodoxas, ele viveu a vida de um católico romano, assistindo à missa e editando uma edição de Tomás de Aquino em espanhol.[20] De vendedor de livros em Lyons, Servetus começou a trocar correspondências com Calvino. Ele enviou a Calvino um manuscrito de um livro em que ele estava trabalhando e o bombardeou com perguntas.[21] Calvino, respondendo que não tinha tempo para escrever livros inteiros em resposta a ele, mandou a Servetus uma cópia de suas Institutas.[22]

Por sua vez, ele retornou as Institutas para Calvino com anotações críticas nas margens, das quais Calvino comentou que dificilmente havia uma página “que não estivesse poluída por seu vômito.”[23] Em 1553 Servetus publicou sua resposta às Institutas de Calvino. Foi chamada de Christianismi Restitutio (A Restauração do Cristianismo), e incluía trinta cartas de Servetus a Calvino.[24] Depois que uma cópia do livro alcançou Geneva, um amigo de Calvino, Guillaume de Trie, escreveu a seu primo católico em Lyons sobre Servetus:

O homem de quem falo foi condenado por todas as igrejas que você reprova, contudo você o tolera e até o deixa imprimir seus livros que estão repletos de blasfêmias que eu nem preciso dizer mais. Ele é um espanhol-português, chamado Michael Servetus. Esse é seu verdadeiro nome, mas atualmente ele atende pelo nome de Villeneuve e pratica medicina. Ele morou algum tempo em Lyons. Agora ele está em Vienne onde seu livro foi impresso por um certo Balthazar Arnoullet, e a fim de que você não pense que estou falando sem dar garantias, estou mandando a você o primeiro fólio.[25]

Isto colocou Servetus em problemas com as autoridades católicas romanas e ele foi preso em 4 de abril. Entretanto, no dia 7 de abril ele escapou e os católicos tiveram que se contentar em queimá-lo em efígie.[26] A sentença de Servetus foi: “Ser queimado vivo em um fogo lento até que seu corpo vire cinzas. Para o presente, a sentença deve ser executada em efígie e seus livros queimados.”[27] Após sua fuga de Vienne, Servetus estupidamente foi para Genebra e se mostrou na igreja em 13 de agosto – um domingo quando Calvino estava pregando – e foi imediatamente preso.[28] Após um julgamento em que Calvino desempenhou um papel, Servetus foi executado em 27 de outubro de 1553. A sentença desta vez foi:

Nós o condenamos, Michael Servetus, a ser detido, e levado ao local de Champel, para ser amarrado a uma estaca e queimado vivo, junto com seus livros, tanto os escritos por sua própria mão quanto os impressos, até que seu corpo seja reduzido a cinzas; e dessa forma você acabará seus dias para servir de exemplo a outros que possam querer praticar o mesmo.[29]

Suas últimas palavras foram: “Ó Jesus, Filho do Eterno Deus, tenha piedade de mim!”[30] É verdadeiramente irônico que Servetus foi queimado em efígie pelos católicos e de fato pelos protestantes.

Visto que Servetus não foi queimado na estaca por imoralidade, sedição, ou qualquer outro crime contra o estado, mas, antes, por manter opiniões teológicas que foram julgadas heréticas, uma rápida olhada em suas concepções teológicas está a caminho. Embora ele considerasse a Bíblia como a palavra de Deus, em cada um dos seus princípios religiosos ele tem uma mistura de verdade e erro.[31] As principais acusações contra ele eram por manter opiniões heréticas sobre a Trindade e o batismo infantil.[32] Os católicos, entretanto, tinham algo mais contra ele, pois ele chamou o Papa: “A mais desprezível de todas as bestas, a mais descaracada das prostitutas!”[33] Para ele a missa era uma monstruosidade satânica e uma invenção de demônios.[34] Além disso, ele comparou o Papa ao anticristo e ao dragão de sete cabeças em Apocalipse.[35] Sobre a Trindade, Servetus não era um unitariano, mas tinha uma concepção estranha da Trindade, em uma grande medida, peculiar a si mesmo. Ele se refere aos trinitarianos como “tri-teístas” e “ateístas,”[36] e comparava a Trindade com Cérbero, o cão de três cabeças da mitologia grega, que guardava a entrada para o submundo.[37] Ele alegava crer na verdadeira Trindade.[38]

Mas, embora sua concepção da Trindade seja mais parecida com o Sabelianismo,[39] Williston Walker (1860-1922) sugere que toda a controvérsia doutrinária é resumida na distinção entre as frases “Filho eterno de Deus” e “Filho do eterno Deus.”[40] Sobre o batismo, Servetus considerava o batismo infantil como uma “invenção diabólica e uma falsidade infernal destrutiva do Cristianismo.”[41] Todavia, ele ainda defendia a regeneração batismal, ele somente cria que devia ser precedido pelo arrependimento e experimentado quando alguém atingisse a idade de trinta anos.[42]

Ele até escreveu duas cartas a Calvino sobre o batismo adulto e o exortou a seguir seu exemplo.[43] Quanto a algumas outras doutrinas, Servetus da mesma forma mantinha uma mistura de verdade e erro. Ele apoiou o reino premilenar de Cristo mas interpretava o livro de Apocalipse historicamente.[44] Ele negava a doutrina da predestinação de Calvino mas colocava ênfase na necessidade de boas obras.[45]

Agora, embora as concepções teológicas de Servetus não foram ortodoxas, elas não eram de forma alguma criminosas, mas é por isso que ele foi queimado: por opiniões mentais, não ações físicas. Mas a ironia das ironias é que embora ele nunca foi julgado como Servetus, o próprio Calvino foi também várias vezes acusado de heresia. Durante sua primeira estada em Genebra, ele foi acusado de ser ariano, especialmente quando ele se recusou a assentir com o Credo Atanasiano.[46] E mais tarde, em 1543 e 1544, Calvino foi novamente acusado de manter concepções não-ortodoxas da Trindade e a deidade de Cristo.[47]

O fato de Calvino mesmo, fisicamente, não ter queimado Servetus não significa que ele não foi responsável. Sete anos antes, Calvino escreveu uma carta a Farel em que ele declarou:

Servetus recentemente me escreveu, e anexou em sua carta um longo volume dos seus delírios, cheio de ostentação, para que eu devesse ver algo espantoso e desconhecido. Ele faz isto para se aproximar, caso seja de meu acordo. Mas eu estou indisposto a dar minha palavra em favor de sua segurança, pois se ele vier, eu nunca o deixarei escapar vivo se a minha autoridade tiver peso.[48]

E ainda que Servetus veementemente afirmou, e Calvino igualmente negou, a acusação de que a carta original do amigo de Calvino em Genebra a seu primo católico em Lyons era obra do próprio Calvino, os historiadores estão divididos quanto à cumplicidade de Calvino.[49] Não há dúvida, entretanto, que Calvino entregou as cartas que Servetus escreveu para ele, assim como páginas de suas Institutas nas quais Servetus tinha escrito notas marginais contra o batismo infantil, para provar a identidade de Servetus às autoridades em Vienne.[50] Estas foram fornecidas através do amigo de Calvino, que escreveu novamente a seu primo:

O resto está todo aqui, o grande livro e os outros escritos do mesmo autor, mas eu posso dizer a você que eu não tive dificuldade para conseguir de Calvino o que estou enviando. Não que ele não queira reprimir tais execráveis blasfêmias, mas ele acredita que seu dever é antes convencer os heréticos com a doutrina do que com outros meios, pois ele não emprega a espada da justiça. Mas eu protestei com ele e apontei a posição embaraçosa em que eu deveria ser colocado se ele não me ajudasse, para que no final ele me desse o que você vê. Para o resto eu espero mais tarde, quando o caso estiver mais avançado, para obter de você toda uma resma de papel, que o patife imprimiu, mas eu acho que, pelo presente, você já tem o suficiente.[51]

Tudo isto foi feito antes de Servetus sequer chegar em Genebra.

O relato da prisão de Servetus já foi mencionado. O que precisa ser acrescentado, entretanto, é que o próprio Calvino foi responsável pela prisão de Servetus. Beza admite que foi por causa da informação de Calvino aos magistrados que Servetus foi colocado na prisão,[52] cujo fato Calvino não nega, como pode ser visto pelas cartas que ele escreveu durante o julgamento. Para Farel ele escreveu: “Temos agora um novo caso sob consideração com Servetus. Ele pretendeu talvez passar por esta cidade; pois ainda não é sabido a intenção dele ter vindo. Mas depois que ele foi reconhecido, eu pensei que ele deveria ser detido.”[53]

Algumas semanas mais tarde, Calvino escreveu a um amigo em Basel: “Finalmente, em uma má hora, ele veio a este lugar, quando, por mim instigado, um dos procuradores ordenou-o a ser conduzido para a prisão; pois eu não escondo que eu considerei meu dever dar um basta, tanto quanto podia, neste mais obstinado e indisciplinado homem, para que sua influência não possa mais espalhar.”[54] Quanto a por que McGrath chama Calvino de “um indireto primeiro preferente de acusações,”[55]

Francois Wendel (1905-1972) aponta: “A lei genebrina prescrevia que todo acusador deve se entregar como prisioneiro pelo período do processo que ele estava iniciando, para que ele próprio possa sofrer uma pena apropriada se o acusado for julgado inocente.”[56] Então, o amigo de Calvino, Nicolas de la Fontaine, foi detido no lugar de Calvino.[57] O julgamento durou mais de dois meses e o próprio Calvino redigiu um documento de trinta e oito acusações contra Servetus.[58]

Cinco dias em julgamento, Calvino escreveu para Farel: “Eu espero que o veredito seja pena de morte.”[59] McGrath nos informa que “o julgamento, condenação, e execução (incluindo a escolha do modo particular de execução) de Servetus foram inteiramente ocupação do conselho da cidade, em um período em sua história quando era particularmente hostil a Calvino.”[60] E embora ele mais adiante admite que Calvino serviu como um “hábil testemunho teológico,” McGrath insiste que tal testemunho “poderia ter vindo de qualquer teólogo ortodoxo da época, se protestante ou católico romano.”[61]

Mas isto é irrelevante, pois Calvino, que devia ter sabido melhor, é o único que servia como a “principal testemunha para a perseguição.”[62] Calvino pleiteou a pena de morte tendo como base um verso da lei mosaica: “E aquele que blasfemar o nome do Senhor, certamente será morto; toda a congregação certamente o apedrejará. Tanto o estrangeiro como o natural, que blasfemar o nome do Senhor, será morto” (Lv 24.16).[63]

Também sabemos que Calvino ainda estava triste com Servetus por ele ter faltado um encontro com ele em Paris anos antes, pois Calvino o mencionou quando recontou sua última entrevista com Servetus: “Eu o fiz lembrar amavelmente como eu tinha arriscado minha vida mais de 16 anos atrás para ganhá-lo para nosso Salvador.”[64] É interessante notar que durante o julgamento Servetus escreveu uma lista de questões para perguntar a Calvino. A sexta questão era: “Se ele não sabia bem que não é o ofício de um ministro do evangelho fazer uma acusação máxima e perseguir um homem na justiça para a morte?”[65]

Não foi somente antes do julgamento e durante o julgamento que Calvino expressou sua esperança pela morte de Servetus, mas depois do julgamento também. No período de seis meses da condenação de Servetus, Calvino escreveu um livro defendendo suas ações. Em sua Defense of the Orthodox Trinity Against the Errors of Michael Servetus, Calvino defendeu o uso da força civil para executar “heréticos” religiosos e mantinha que “quem quer que agora argumentar que é injusto colocar heréticos e blasfemadores à morte, consciente e condescentemente incorrerá em sua mesma culpa.”[66]

Schaff corretamente reflete que os argumentos de Calvino “são principalmente tirados das leis judaicas contra a idolatria e a blasfêmia, e dos exemplos dos reis piedosos de Israel. Mas careciam de argumentos do Novo Testamento.”[67] Depois que ele escreveu contra os erros de Servetus, Calvino escreveu para Bullinger e lamentou: “Outros falam com maior aspereza, dizendo que eu sou, de fato, um mestre da crueldade e atrocidade – que eu agora mutilo com minha caneta o homem morto que pereceu em minhas mãos.”[68]

Em uma carta de 1561, de Calvino para o marquês de Poet, camareiro superior para o Rei de Navarre, ele diz intolerantemente: “Honra, glória, e riquezas será a recompensa de suas dores: mas acima de tudo, não deixe de livrar o país daqueles zelosos patifes que incitam o povo para se revoltar contra nós. Tais monstros devem ser exterminados, como exterminei Michael Servetus o espanhol.”[69] Nove anos depois, Calvino ainda justificava suas ações: “E que crime cometi, se nosso Conselho, por meio de minha exortação, de fato, mas em conformidade com a opinião de várias igrejas, vingou suas execráveis blasfêmias?”[70] Todas as justificativas de Calvino para a morte de Servetus foram notavelmente defensivas.

Tem sido corretamente apontado por todo calvinista que tem escrito sobre o assunto que Calvino favoreceu a espada ao invés de ser queimado na estaca,[71] embora Clark vai aos extremos ao tentar justificar seu mentor: “A história de que ele queria que Servetus fosse queimado na estaca é uma invenção dos inimigos de Calvino. Ao menos duas vezes em seus escritos Calvino recorre aos juízes de Servetus como testemunhas de que ele solicitou que Servetus não fosse queimado.”[72] Novamente, isto é certamente verdade. As passagens em questão podem ser encontradas em duas das cartas de Calvino a Farel:

Eu espero que ele obtenha, pelo menos, a sentença de morte; mas eu desejo que a severidade da punição possa ser mitigada.[73]

Ele será levado à punição amanhã. Tentamos alterar o modo de sua morte, mas em vão. Por que não obtemos sucesso, eu adio para o relato até ver você.[74]

Entretanto, a razão para isto era que Calvino queria que Servetus fosse executado como um transgressor contra o Estado. Hughes, buscando exonerar Calvino, nos informa que “a pena de morte foi imposta pelas autoridades civis.”[75] Entretanto, o historiador Leonard Verduin, escrevendo para a Calvin Foundation, explica por que: “Calvino queria que Servetus fosse eliminado como um transgressor contra a ordem civil.

Morte na fogueira era para os transgressores na área de religião. Por isso a preocupação de Calvino com o caso.”[76] Verduin mais adiante comenta sobre o “pedido de clemência” de Calvino:

Alguns têm tentado fazer algo do fato que, no fim do julgamento de Servetus, Calvino se esforçou para que o homem fosse destruído de outra maneira que não a fogueira. Entretanto, o fato é que Calvino não se opunha a extermination no caso de Servetus, meramente contra o modo proposto.

Morte na fogueira tinha sido a punição para os heréticos por mais de um milênio, e Calvino, percebendo que a morte por heresia estava se tornando questionável na mente do povo, teria preferido a execução por um meio em que o aspecto da sedição antes que o da heresia do delito do homem fosse salientado. Na mente de Calvino, uma ainda implicava na outra – heresia implicava em sedição.[77]

Se levado a cabo, o pedido de Calvino asseguraria que ele se livraria da culpa pelo feito, mas não provaria que ele estava sendo misericordioso, como alguns dos defensores de Calvino tentam provar.

Apesar dos fatos documentados da história, alguns calvinistas ainda buscam justificar Calvino, como o calvinista Cunningham afirma: “Alguns imprudentes admiradores de Calvino têm tentado isentá-lo da responsabilidade da morte de Servetus.”[78] Isto é feito de várias formas. A primeira é fazendo declarações gerais sobre Calvino e Servetus. McGrath nos informa que “Servetus foi o único indivíduo executado por suas opiniões religiosas em Genebra durante a existência de Calvino, em um tempo quando as execuções desta natureza eram comuns em todos os lugares.”[79]

McNeil argumenta que embora “muitos ficariam felizes em condenar e desprezar Calvino pelo caso de Servetus,” “ninguém deve ser julgado por seus piores atos.”[80] W. Gary Crampton nos recorda que Calvino “até buscou evangelizar o blasfemo Servetus até o dia de sua morte.”[81] Scott vai tão longe a ponto de creditar a Servetus a destruição do Cristianismo europeu caso Servetus não fosse impedido de continuar: “Não restringido, Servetus teria desorganizado tanto a Reforma quanto o Catolicismo, e deixado a Europa desolada nas cinzas de sua fé séculos antes que essa situação fosse na verdade percebida.”[82] Como é evidente pelas observações acima, o caso de Servetus é um grande embaraço aos calvinistas.

A segunda forma de tentar justificar Calvino é fazê-lo um “filho de sua época.”[83] Bratt mantém que “devemos lembrar que Calvino simplesmente refletia as idéias de sua época.”[84] McGrath insiste que Calvino deve ser “contextualizado,” e nos recorda que “todo corpo cristão que traça sua história ao século dezesseis tem sangue abundantemente espalhado sobre suas credenciais.”[85] Wendel defende “que é contrário à uma concepção sadia da história tentar aplicar nosso modo de julgamento e nosso critério moral ao passado.”[86]

McNeil nos conta que a época de Calvino era “uma época de queimar e matar em massa por questões religiosas.”[87] Hughes justifica Calvino porque “era costume daquela época queimar heréticos, e Calvino, na medida em que aprovava o que era feito, estava agindo de acordo com esse costume.”[88] Adiante ele explica que Servetus teria sido executado “ainda que Calvino não tivesse vivido em Genebra.”[89] Mas fazer Calvino um “filho de sua época” naõ é nada senão o mesmo argumento usado pelos calvinistas em sua busca para defender os regulamentos de Calvino em Genebra.

O terceiro meio de justificar Calvino da morte de Servetus é comparando-o com os outros reformadores. Boettner corretamente diz que “os outros reformadores aprovaram esta e outros sentenças de morte contra heréticos.”[90]

Assim, Calvino não estava sozinho em suas opiniões de matar heréticos. Durante o julgamento, o conselho da cidade de Genebra conversou com outras quatro cidades. A resposta foi unânime contra Servetus.[91] Após receber as várias respostas, a sentença foi passada por Genebra: “Vossos Lordes, tendo recebido as opiniões das Igrejas de Berne, Basel, Zurique e Schaffhausen sobre o caso de Servetus, condenou o mencionado Servetus a ser levado a Champey e lá ser queimado vivo.”[92]

Bullinger e Melanchthon também aprovaram a execução. Durante o julgamento de Servetus, Bullinger escreveu a Calvino que “Deus tinha dado ao Conselho de Genebra uma oportunidade mais favorável para defender a verdade contra a profanação da heresia, e a honra de Deus contra a blasfêmia.”[93] Melanchthon escreveu a Bullinger em 1555: “Julgo também que o Senado Genebrino agiu de maneira perfeitamente correta, para colocar um fim neste obstinado homem, que nunca poderia cessar de blasfemar. E eu me admiro com aqueles que desaprovam esta severidade.”[94]

Ele também escreveu a Calvino: “A você também a Igreja deve gratidão no presente momento, e continuará devendo até a última posteridade. Eu perfeitamente consinto com sua opinião. Afirmo também que seus magistrados agiram correto em punir, após um julgamento normal, este blasfemo homem.”[95] Martin Bucer insistiu que “Servetus merecia ser desentranhado e rasgado em pedaços.”[96] Beza escreveu uma palavra especial em defensa da execução: “A punição foi mais merecidamente infligida sobre Servetus em Genebra, não porque ele era um sectário, mas uma combinação monstruosa de mera impiedade e repugnante blasfêmia, com a qual ele tinha por todo o período de trinta anos, pela fala e pela escrita, poluído tanto o céu quanto a terra.”[97] Mas se as opiniões dos outros reformadores não eram bíblicas, então que diferença faz o que eles acreditavam?

Surpreendentemente, a maneira final em que os calvinistas buscam justificar Calvino é comparando-o com os papistas. Para exonerar Calvino, como alguns calvinistas têm concluído, dizendo que Servetus teria sido executado pelos católicos também é dizer que a vida em Genebra sob o Evangelho era a mesma que a vida em um país católico sob o Papa.[98]

De fato, é pior, pois como Schaff diz: “A perseguição merece uma condenação muito mais severa em um país protestante do que em um católico, porque é inconsistente. O Protestantismo deve se manter ou desmoronar com a liberdade de consciência e liberdade de culto.”[99] Ronald Wallace até admite que os católicos não eram perseguidos enquanto se mantinham quietos.[100]

Isto, ainda, condena Calvino. Hughes descarta a execução de Servetus como “apenas uma única gota no oceano de torturas e perseguições e mortes selvagens que os partidários da Reforma estavam sofrendo naqueles dias quando era comum caçar e destruir homens como animais.”[101] Scott lamenta o fato de que “os governantes de Vienne não tinham sido condenados, pelos historiadores ou pelos teólogos, por sentenciar Servetus à morte estando ausente. Seus nomes não estão indissoluvelmente ligados a Servetus nos argumentos contra o Catolicismo.”[102]

Mas por que os católicos deveriam ser condenados mais do que o normal por fazer o que eles já faziam por anos? Roland Bainton nos recorda das raízes históricas das leis que detiveram e condenaram Servetus: “A lei sob a qual Servetus tinha sido primeiro aprisionado era do Sacro Império Romano; a lei pela qual ele foi finalmente condenado era do Códice de Justiniano, que prescreve a pena de morte por duas ofensas eclesiásticas – a negação da Trindade e a repetição do batismo.”[103] Que diferença há, então, entre Calvino e Torquemada (1420-1498) ou os reformadores e a Inquisição?

Calvino deve ser considerado culpado pela morte de Servetus. Dizer que ele “não era mais culpado do que seus concidadãos,”[104] é abjurar os fatos da história. Verduin compactamente resume o caso contra Calvino:

A morte na fogueira de Servetus – que seja dito com a maior claridade – foi um feito pelo qual Calvino deve ser considerado largamente responsável. Não aconteceu apesar de Calvino, como alguns de seus admiradores exageradamente ardentes estão acostumados a dizer. Ele planejou-a antecipadamente e manobrou-a do início ao fim. Ocorreu por causa de Calvino e não apesar dele. Depois de acabado, Calvino defendeu-a, com todos os argumentos possíveis e impossíveis.[105]

O veredito dos historiadores não calvinistas é unânime. O respeitado historiador luterano, John Mosheim (1694-1755), julgou em favor de Servetus.[106] O historiador inglês Gibbon observou: “Eu estou mais profundamente escandalizado pela única execução de Servetus do que pelas matanças que ficaram conhecidas nos Auto da Fès da Espanha e Portugal. O zelo de Calvino parece ter sido envenenado pela maldade pessoal, e talvez inveja.”[107]

E o historiador batista William Jones, embora reconhecendo “muitos pontos de vista doutrinários com Calvino,” todavia disse: “Eu ativamente desaprovo toda tentativa de aliviar a barbaridade da conduta de Calvino.”[108] Mas não é apenas os não calvinistas que têm condenado Calvino, pois até os próprios calvinistas reconhecem sua culpa:

Quando tudo for entendido, os admiradores de Calvino devem olhar sobre isto com vergonha.[109]

Em nosso julgamento Calvino foi culpado de pecado.[110]

Não há dúvida que Calvino antecipadamente, na hora, e depois do acontecimento, explicitamente aprovou e defendeu a execução dele, e assumiu a responsabilidade do procedimento.[111]

Em 1903, alguns arrependidos calvinistas europeus erigiram um monumento a Servetus sobre o qual eles esculpiram:

Em 27 de outubro de 1553, morreu na estaca em Champel, Michael Servetus, de Villeneuve d’Aragon, nascido em 29 de setembro de 1511. Reverentes e agradecidos filhos de Calvino, nosso grande reformador, mas condenando um erro que foi este de sua época, e firmemente aderindo à liberdade de consciência de acordo com os verdadeiros princípios da Reforma e o evangelho, temos erigido este monumento, em 27 de outubro de 1903.[112]

Esta construção sem dúvida ajudou a aplacar os oponentes dos calvinistas, mas aconteceu algumas centenas de anos, tarde demais para ajudar Servetus.

A razão por que tanto papel e tinta tem sido dado à controvérsia entre Calvino e Servetus é a mesma que entre Calvino e Genebra: Supõe-se que Calvino foi um teólogo cristão que baseou todas as suas opiniões na Bíblia apenas. Esta é a alegação que os calvinistas inflexivelmente fazem sobre ele. Como Gregg Singer diz dele: “Não obstante Calvino respeitava muito Agostinho e os outros Pais da Igreja, ele olhou além deles no que tange as Escrituras, que eram, para ele, a regra infalível de fé e prática.”[113]

Por essa razão, a conduta de Calvino na questão de Servetus é inexcusável se o que os calvinistas dizem sobre ele for verdade, pois nenhum calvinista hoje em dia dificilmente defenderia que a perseguição de “heréticos” é bíblica – seja pelo Estado ou pela Igreja.


[1] Schaff, History, vol. 8, p. 687.

[2] Warlfield, Calvin, p. 25.

[3] Henry Cole, nota ao Prefácio Dedicado a Calvino, Eternal Predestination, p. 20.

[4] Kuyper, p. 100.

[5] Philip E. Hughes, Introdução ao The Register of the Company of Pastors of Geneva in the Time of Calvin, p. 243.

[6] McGrath, Calvin, p. 116.

[7] A data é muitas vezes dada como 1509 – ano de nascimento de Calvino.

[8] Schaff, History, vol. 8, p. 713.

[9] Ronald H. Bainton, Hunted Heretic (Boston: The Beacon Press, 1953), p. 16.

[10] Schaff, History, vol. 8, pp. 714-715.

[11] Parker, p. 138.

[12] Schaff, History, vol. 8, p. 720.

[13] Newman, vol. 2, p. 192.

[14] Schaff, History, vol. 8, pp. 723-724.

[15] Ibid., p. 724.

[16] Bainton, Hunted Heretic, p. 118.

[17] Ibid., p. 129.

[18] Ibid.

[19] Schaff, History, vol. 8, p. 787.

[20] Bainton, Hunted Heretic, p. 130.

[21] Schaff, History, vol. 8, pp. 727-728.

[22] Ibid., p. 728.

[23] Calvino, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 728.

[24] Schaff, History, vol. 8, p. 730.

[25] Guillaume de Trie, citado em Bainton, Hunted Heretic, p. 153.

[26] Schaff, History, vol. 8, p. 762.

[27] Citado em Parker, p. 143.

[28] Walker, p. 332.

[29] Citado em Schaff, History, vol. 8, p. 782.

[30] Michael Servetus, citado em Bainton, Hunted Heretic, p. 212.

[31] Schaff, History, vol. 8, p. 737.

[32] Ibid., pp. 769-770.

[33] Michael Servetus, citado em Bainton, Hunted Heretics, p. 20.

[34] Schaff, History, vol. 8, p. 753.

[35] Ibid., p. 733.

[36] Michael Servetus, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 741.

[37] Schaff, History, vol. 8, p. 742.

[38] Ibid., p. 771.

[39] Bainton, Hunted Heretic, p. 44-45; Schaff, History, vol. 8, p. 742.

[40] Walker, p. 342.

[41] Schaff, History, vol. 8, p. 770.

[42] Ibid., p. 750.

[43] Ibid., p. 725.

[44] Ibid., pp. 754, 756.

[45] Ibid., p. 749.

[46] Steinmetz, p. 12.

[47] De Greef, pp. 61, 62.

[48] Carta de Calvino a Farel, 13 de fevereiro de 1546, em João Calvino, Letters of John Calvin (Edinburgo: The Banner of Truth Trust, 1980), p. 82.

[49] Bainton, Hunted Heretic, p. 157; Schaff, History, vol. 8, pp. 758-759; Wallace, p. 76; Walker, pp. 331-332.

[50] Schaff, History, vol. 8, p. 760.

[51] Bainton, Hunted Heretic, p. 157.

[52] Beza, p. 70.

[53] Carta de Calvino a Farel, 20 de agosto de 1553, em Calvino, Letters, p. 158.

[54] Calvino, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 765.

[55] McGrath, Calvin, p. 116.

[56] Wendel, p. 95.

[57] Walker, p. 333.

[58] Schaff, History, vol. 8, p. 769.

[59] Carta de Calvino a Farel, 20 de agosto de 1553, em Calvino, Letters, p. 159.

[60] McGrath, Calvin, p. 116.

[61] Ibid.

[62] Wallace, p. 77.

[63] Boettner, Predestination, p. 418.

[64] Calvino, citado em Potter e Greengrass, p. 108.

[65] Michael Servetus, citado em Bainton, Hunted Heretic, p. 200.

[66] Calvino, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 791.

[67] Schaff, History, vol. 8, p. 792.

[68] Calvino, citado em Potter e Greengrass, p. 109.

[69] Carta de Calvino ao marquês de Poet, citado em Voltaire, The Works of Voltaire (Nova York: E. R. DuMont, 1901), vol. 4, p. 89. Robert Robinson faz referência a isto, Ecclesiastical Researches (Gallatin: Church History Research & Archives, 1984), p. 348, e Benedict, History, vol. 1, p. 186.

[70] Calvino, citado em Schaff, History, vol. 8, pp. 690-691.

[71] Hughes, p. 19; de Greef, p. 176; Wallace, pp. 73, 77; Cunningham, Reformers, p. 320; Parker, p. 145; George, p. 249; McNeil, p. 228; Otto Scott, p. 71.

[72] Gordon H. Clark, Thales to Dewey, 2a ed. (Jefferson: The Trinity Foundation, 1989), p. 111.

[73] Carta de Calvino a Farel, 20 de agosto de 1553, em Calvino, Letters, p. 159.

[74] Calvino, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 783.

[75] Hughes, p. 18.

[76] Verduin, Reformers, p. 52.

[77] Leonard Verduin, The Anatomy of a Hybrid (Sarasota: The Christian Hymnary Publishers, 1976), p. 207.

[78] Cunningham, Reformers, p. 316.

[79] McGrath, Calvin, p. 116.

[80] McNeil, p. 228.

[81] Crampton, Calvin, p. 10.

[82] Otto Scott, p. 72.

[83] McGrath, Calvin, p. 116.

[84] Bratt, Teachings of Calvin, p. 41.

[85] McGrath, Calvin, p. 117.

[86] Wendel, p. 97.

[87] McNeil, p. 228.

[88] Hughes, p. 17.

[89] Ibid., p. 18.

[90] Boettner, Predestination, p. 414.

[91] Schaff, History, vol. 8, p. 709.

[92] Register of Geneva, p. 290.

[93] Heinrich Bullinger, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 709.

[94] Philip Melanchthon, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 707.

[95] Ibid., p. 707.

[96] Martin Bucer, citado em Schaff, History, vol. 8, p. 708.

[97] Beza, p. 73.

[98] Simon Kistemaker, Calvinism: Its History, Principles and Perspectives (Grand Rapids: Baker Book House, 1966), p. 23; Hughes, pp. 18, 20; Parker, pp. 144-145; McGrath, Calvin, p. 118.

[99] Schaff, History, vol. 8, p. 691.

[100] Wallace, pp. 81-82.

[101] Hughes, p. 19.

[102] Otto Scott, p. 71.

[103] Bainton, Hunted Heretic, p. 210.

[104] “The Life of John Calvin,” em Calvino, Letters of John Calvin, p. 27.

[105] Verduin, Reformers, p. 51.

[106] Schaff, History, vol. 8, p. 684.

[107] Gibbon, vol. 3, p. 314.

[108] Jones, vol. 2, pp. 238, 239.

[109] McNeil, p. 347.

[110] Bratt, Teachings of Calvin, p. 41.

[111] Cunningham, Reformers, pp. 316-317.

[112] Citado em Augustus H. Strong, Systematic Theology (Valley Forge Judson Press, 1907), p. 778.

[113] Singer, p. 7.

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