igreja perseguida
Quase 200 mortos, maioria cristãos, em ataque de muçulmanos fulani
A vila de Yelwata, situada em Guma, no estado de Benue, Nigéria, foi alvo de um ataque violento perpetrado por jihadistas Fulani armados. A localidade, de maioria católica e próxima à capital estadual, Makurdi, foi invadida durante a noite por grupos que incendiaram casas e assassinaram moradores, muitos deles cristãos.
A Truth Nigeria, veículo de comunicação registrado nos Estados Unidos que documenta a perseguição religiosa na Nigéria, informou que mais de 200 pessoas foram mortas ou queimadas de forma irreconhecível. A Anistia Internacional declarou em publicação na rede X que ao menos 100 pessoas morreram e que muitas seguem desaparecidas. Já Tersoo Kula, porta-voz do gabinete do governador de Benue, relatou que as autoridades locais contabilizaram 45 mortos, após visita ao local.
Segundo testemunhas e líderes religiosos, o ataque durou cerca de duas horas, tempo suficiente para a destruição generalizada de casas e para o assassinato de dezenas de civis. A vila, que também abriga deslocados internos fugidos de ataques anteriores, foi atingida enquanto parte da população dormia. “Muitas famílias foram trancadas e queimadas dentro de seus quartos”, declarou a Anistia Internacional.
Reação
O padre Moses Aondover Iorapuu, Vigário Geral Pastoral da Diocese de Makurdi e pároco da Paróquia do Espírito Santo, classificou o ataque como um reflexo das “lutas diárias enfrentadas por muitos cidadãos de Benue”. Em artigo publicado no jornal Catholic Star, ele afirmou: “O recente ataque a Yelewata, no estado de Benue, que deixou mais de 200 mortos ou queimados irreconhecíveis, é um lembrete sombrio das lutas diárias enfrentadas por muitos cidadãos de Benue”.
Ao portal Crux, o sacerdote disse que “esses agressores são animais e bárbaros” e manifestou indignação diante da passividade das forças de segurança. “O mais preocupante é que alguns militares estavam nas proximidades e até mesmo os policiais que estavam entre eles e a casa da missão só conseguiram impedi-los de ter acesso à casa da missão, onde a maioria dos deslocados estava alojada”, afirmou.
O líder religioso também expressou frustração com a ausência de medidas efetivas do governo, especialmente após o testemunho do bispo Wilfred Anagbe, da Diocese de Makurdi, em audiência pública no Congresso dos Estados Unidos, em 14 de fevereiro de 2024. Na ocasião, Anagbe afirmou que os cristãos na Nigéria estavam sendo vítimas de um “genocídio” e apelou por intervenção internacional. Após esse depoimento, os ataques contra comunidades cristãs aumentaram.
Iorapuu declarou: “Esperávamos que os ataques se intensificassem após o testemunho do bispo Wilfred Anagbe nos EUA sobre a Igreja perseguida, mas acreditávamos que o aviso dos EUA faria o governo ser proativo; erramos novamente”. E acrescentou: “Desta vez, mais de 200 cristãos foram mortos e queimados. São vidas humanas desperdiçadas; não são números que possam ser contabilizados”.
Oposição à impunidade
Durante declaração pública, o presidente da administração local de Guma foi direto ao afirmar: “Estes são fulanis”, pedindo que não se utilizasse mais os termos “supostos pastores” ou “bandidos”. Para o padre Iorapuu, a identidade dos agressores é conhecida: “As evidências confiáveis de quem eles são são inegáveis, então por que o governo é incapaz de garantir a segurança de seus cidadãos?”.
O ativista Emeka Umeagbalasi, presidente da organização Intersociety (Sociedade Internacional para as Liberdades Civis e o Estado de Direito), sugeriu que a passividade governamental seria parte de um projeto de islamização nacional. Em entrevista ao Crux, ele afirmou: “Há uma agenda para islamizar a Nigéria”.
Umeagbalasi responsabilizou diretamente o ex-presidente Muhammadu Buhari (29 de maio de 2015 a 29 de maio de 2023), filho de um líder Fulani, por ter promovido essa agenda, armando pastores jihadistas e nomeando apenas muçulmanos para postos estratégicos. Segundo ele, essa estrutura resultou em “um exército jihadista”, com acesso a armas do Estado.
Contexto e impactos
Nos últimos meses, o estado de Benue tem sido palco de ataques frequentes. Em maio, 20 pessoas foram assassinadas por supostos pastores armados na região de Gwer West. Em abril, 40 cristãos foram mortos no estado vizinho de Plateau. Iorapuu alertou que os ataques sistemáticos afetam diretamente a presença cristã no país. “Cada ataque altera a demografia cristã na Nigéria”, disse.
A Constituição nigeriana assegura liberdade religiosa, mas a repetição dos ataques a comunidades majoritariamente cristãs, especialmente nas regiões centrais do país, tem levantado preocupações internacionais. A maioria das vítimas pertence à Igreja Católica, mas entre os mortos também há membros de outras denominações evangélicas, como igrejas pentecostais e batistas.
O episódio de Yelwata representa mais um capítulo da crise prolongada entre pastores Fulani – predominantemente muçulmanos – e comunidades agrícolas cristãs na Nigéria central. A ausência de justiça e a impunidade reiterada têm fortalecido a percepção, entre líderes cristãos e organizações de direitos humanos, de que há uma perseguição deliberada e crescente contra os cristãos no país.
The Nigerian authorities must immediately end the almost daily bloodshed in Benue state and bring the actual perpetrators to justice.
The horrifying killing of over 100 people by gunmen that invaded Yelewata; from late Friday into the early hours of Saturday 14 June 2025, shows…
— Amnesty International Nigeria (@AmnestyNigeria) June 14, 2025