opinião

Satisfação com um não

O silêncio de Deus não é, de forma alguma, para nos deprimir.

em

Lágrimas (Foto: Reprodução/Pexels)

Quantos de nós já nos deparamos com situações e circunstâncias difíceis relacionadas à nossa fé cristã!? Quem nunca enfrentou problemas espirituais diversos que, à primeira vista, pareciam conflitantes e até insolucionáveis!? Orações não respondidas, pedidos direcionados a Deus não atendidos, enfermidades não curadas, súplicas que, segundo a nossa ótica, foram atendidas só depois de um longo período de espera — que para nós representou uma eternidade! Diante disso, definhamos neste dilema: Deus não fala, Deus não responde, Deus não cura, Deus demora… E nessa “valsa” de murmúrio espiritual vamos nos envolvendo em tais questões e “sofrimentos”. Se situações assim, por um lado, levam-nos ao descontentamento, por outro lado, ensina-nos a agir de forma mais sensata e positiva, lembrando-nos daquela antiga, mas tão atual, expressão paulina: “A minha graça te basta” (2Co 12.9a).

Sabemos, pela Palavra de Deus, que Ele “é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera” (Ef 3.20). Mas isso não exclui o fato de que, em certos momentos ou circunstâncias, receberemos um NÃO de Deus ou simplesmente um SILÊNCIO. Em última análise, não significa que sempre receberemos o que pedimos. Deus poderá agir sem respostas, em silêncio. Ocorre assim quando, por sua presciência, o Senhor não atende logo nosso pedido, pois este poderá resultar em algo negativo para nossa vida. Portanto, em certos casos, embora seja difícil para nós, o silêncio é essencial a fim de que vivamos uma experiência mais relacional com Deus.

Seu silêncio não é, de forma alguma, para nos deprimir, para nos excluir ou para nos deixar inexoravelmente sem respostas! Seu silêncio é para que nos tornemos mais espirituais, mais sensíveis às coisas divinas, mais comprometidos com o Reino e assim foquemos mais nas coisas celestiais. Em tais circunstâncias, seu silêncio funciona como o instrumento que foi direcionado a Paulo – o espinho na carne. Este servia para que o apóstolo não se gloriasse (2 Co 12.7-9), mas fosse regulado para servir ao Senhor com humildade, sem arrogância ou prepotência. Tomemos o apóstolo Paulo como exemplo para não nos gloriarmos com um falso sentimento, mas sejamos conscientes de que privilégios nem sempre são bençãos e às vezes não receberemos de Deus algo que seja ideal ou necessário apenas segundo a nossa concepção.

Max Lucado, nesse mesmo sentido, afirma que “há ocasiões em que a única coisa que você quer é a única que jamais conseguirá”. Embora Deus não nos conceda respostas de algumas orações nem atenda todos os nossos pedidos, o seu NÃO pode ser substituído pela lembrança daquilo que Ele já nos concedeu – o que por si só é SUFICIENTE! Às vezes, esse NÃO de Deus virá na forma de explicação ou apresenta algo que é bem mais importante e essencial do que aquilo que pedimos, pois o nosso conceito acerca do que “É BOM PARA NÓS” frequentemente está equivocado.

Situações como a do notável exemplo de Paulo permeiam as páginas do Novo Testamento. São exemplos que demostram o contentamento com o não de Deus e a decisão de continuar confiando nEle, buscando e esperando por suas respostas e direcionamentos para as questões da vida. São histórias que nos fortalecem sentimental e emocionalmente, corroboram a verdade cristã de que nosso Pai e maravilhoso provedor não está limitado a nossos caprichos e desejos, extraem de nosso ser o magnetismo materialista que nos atrai todos os dias a apenas querer receber mais e mais e mais de Deus. Tais exemplos vão contra o utilitarismo religioso que insiste constantemente em absorver mais dEle, mas sem desejar um relacionamento piedoso, devocional e espiritual.

Habacuque, o profeta da fé na terra da escassez, dá-nos uma aula de devoção incircunstancial quando começa a cantar sua oração indiscutivelmente contestatória acerca dos eventos sociais negativos que estavam à sua volta. Enquanto clamava: “Até quando, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás? (Hc 1.2) e a resposta tão esperada não vinha, ele adorava: “ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; o produto da oliveira minta, e os campos não produzam mantimento; as ovelhas da malhada sejam arrebatadas, e nos currais não haja vacas, todavia, eu me alegrarei no Senhor, exultarei no Deus da minha salvação.” (Hc 3.17,18).

Devemos ter consciência de que o foco não deve estar em nossos desejos e anseios, mas na soberana e infinita vontade de Deus. Mesmo que a resposta divina seja um NÃO ou um SILÊNCIO INFINITO para alguma questão que ansiosamente esperamos que aconteça, consideremos que Ele sabe por presciência se o que pedimos é para nossa edificação. Visto que aquilo que ansiamos pode ser um meio pelo qual nos afastaríamos dEle, que nos tornaria pessoas prepotentes e insubmissas, causando danos à nossa vida cristã e à dos que estão ao nosso redor. Sendo assim, o melhor para nós seria ouvir o não ou simplesmente receber o seu silêncio pedagógico.

A exemplo disso, o próprio Cristo, na cruz, ao interrogar: “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?”, em uma das últimas e angustiantes oração ao Pai, ficou sem respostas. Deus, em silêncio, contemplava Seu Filho agonizando, mas sabia que a expiação era necessária para a salvação do mundo, era inevitavelmente imprescindível que Jesus passasse por aquilo.

Embora nos sintamos desamparados e soframos; mesmo que na nossa angústia, não escutemos a voz de Deus, Ele está presente direcionando o curso de nossa história. Ele estabelece o que é indiscutivelmente essencial para que cresçamos espiritualmente. Embora seja doloroso, é preciso; mesmo que seja questionável, é soberanamente divino. O silêncio de Deus é uma das fases para a aprovação. Existem situações nas quais o silêncio de Deus será uma maneira de nos dizer: “Você consegue!”. Num cenário assim, basta que nos contentemos com a sua aparente ausência e mantenhamos a satisfação pelo que Ele já nos proporcionou no passado.

“Satisfeito. A palavra é essa. Um estado de espírito no qual você se sentirá em paz se Deus não lhe der nada além do que você já tem”. Satisfeito com a SUA GRAÇA, porque “de acordo com a perspectiva do céu, a graça é suficiente” (Max Lucado).

Todavia, é essencial que oremos ao Senhor para que Ele gere em nós um sentimento de contentamento e entendamos a sua soberana vontade quando um projeto não der certo. Para que, mesmo quando algo estiver errado segundo a nossa perspectiva, estejamos preparados para receber um NÃO de Deus por intermédio de tais circunstâncias. Como afirma Susanna Cancassi, devemos saber que “os planos de Deus são perfeitos enquanto que nosso parâmetro do que achamos que precisamos é imperfeito. O Senhor sabe o que é melhor para nós, devemos apenas confiar nEle”. Portanto, esteja satisfeito com o seu NÃO, porque o não de Deus é melhor do que o sim das incertezas, do que o sim das ilusões e do que o sim da tentação.

Trending

Sair da versão mobile