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estudos bíblicos

O que a Bíblia diz sobre política?

Como o cristão deve lidar com a política e a separação da Igreja e do Estado.

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Bancada do parlamento da Finlândia (Joakim Honkasalo / Unsplash)

A separação do Estado da igreja: uma herança protestante

Há dois extremos nas quais a Igreja não pode cair: alienar-se da política, tratando-a como coisa vã e entregando-a aos ímpios, nem pode, por outro lado, aliar-se a política numa relação de barganha que confunda os papéis de ambas e enfraqueça a visão e a missão dela no que concerne à adorar a Deus, anunciar Jesus e transformar a sociedade mediante a proclamação do Evangelho e a defesa dos bons valores cristãos.

Tempos de perseguição movida pelo Estado

Durante os três primeiros séculos depois de Cristo, os cristãos sofreram duras perseguições movidas por imperadores romanos pagãos e inimigos da fé cristã.

O que dizer dos tiranos Nero (século I) e Diocleciano (séculos III e IV), sob mando de quem o sangue de muitos inocentes cristãos foi derramado? Gregório de Tours fala sobre a violência de um destes malignos imperadores romanos: “muitas perseguições se levantaram contra o nome de Cristo, e houve tamanha carnificina de fiéis que eles não podiam ser contados”.

Tempos de conciliação promovida pelo Estado

Entretanto, com o famoso Édito de Milão, essa onda de violência movida pelo Estado romano começou a mudar e caminhar numa direção oposta.

O Édito de Milão, promulgado em 13 de junho de 313 (século IV), foi um documento proclamatório no qual se determina que o Império Romano seria neutro em relação ao credo religioso, acabando oficialmente com toda perseguição sancionada oficialmente, especialmente aos cristãos.

Tal documento, publicado em forma de carta, transcreveu o acordo entre os tetrarcas Constantino (imperador do Ocidente) e Licínio (imperador do Oriente).

Avançando um pouco mais nessa relação de paz entre o Estado e a Igreja, o imperador Teodósio, no final do quarto século, decretou o Édito de Tessalônica, pelo qual o Cristianismo foi feito a religião oficial do império romano.

Embora geralmente se atribua a Constantino tal façanha, devido sua própria relação amistosa com os cristãos, a oficialização do cristianismo no império só veio em 380 com o decreto de Teodósio.

Essa aliança (ou seria fusão?) entre Igreja e Estado perdurou durante toda Idade Média. A princípio, a paz e a liberdade que os cristãos passaram a gozar no império romano pareceu valer a pena tal aliança, mas não se demorou muito para perceber como a política começou a corromper a Igreja e desviá-la de sua missão primordial, além de transformá-la numa máquina de guerra.

Tempos de separação entre a Igreja e o Estado

Mas no final da Idade Média (século XVI), em meio ao fermento da idolatria há muito instaurada no catolicismo romano, às ambições políticas dos papas, à corrupção moral do clero e às ameaças das fogueiras da Inquisição contra quem protestasse contrário ao status quo da Igreja, um forte coro de vozes de fora da Igreja (filósofos, artistas, políticos, etc.) e vozes dentre os cristãos começaram a ser erguer clamando, entre outras queixas, pela separação entre a Igreja e o Estado, por maior liberdade individual, e o retorno ao Cristianismo primitivo dos apóstolos, onde mesmo não gozando de prestígio político (“tendo pouca força” – Ap 3.8), a Igreja avançava transformando comunidades onde ela implantava seu trabalho.

Sobretudo a partir da Reforma Protestante (1517), encabeçada pelo monge alemão Martinho Lutero, é que paulatinamente os conceitos de liberdade, tolerância religiosa, democracia e Estado Laico foram alçados ao status de direitos fundamentais do ser humano.

A Reforma Protestante não curou de vez a doença da Igreja-Estado ou Estado-Igreja, inclusive alguns reformadores renomados usaram e abusaram da autoridade do Estado para promover perseguição a outros protestantes, católicos, hereges ou pagãos que discordavam de pontos doutrinários fundamentais do Protestantismo.

Mas a Reforma trouxe o remédio que, administrado pouco a pouco, foi resgatando os papéis distintos de cada uma destas entidades, Igreja e Estado.

Distinções dos papéis do Estado e da Igreja

As obrigações do Estado, ou seja, do governo de uma nação, é prover recursos intelectuais, sociais e materiais para o desenvolvimento de uma sociedade justa, livre e harmônica, na qual se possa ver: geração de emprego e renda, educação escolar, cuidados com a saúde pública, segurança, respeito aos direitos do cidadão, etc. As palavras constantes em nossa bandeira nacional – ORDEM E PROGRESSO – são atribuições inerentes do Estado: garantir a ordem social e promover o progresso da nação. A Carta Maior do Estado é a sua Constituição Federal.

As obrigações da Igreja, embora não alheias às necessidades sociais dos cidadãos, diz respeito prioritariamente à oração por todos os homens, inclusive os que exercem liderança governamental para desfruto de dias quietos e sossegados; proclamação e ensino sistemático do Evangelho para salvação dos homens; defesa firme dos bons valores éticos e morais que garantam a ordem da família e da sociedade; e, secundariamente, auxílio às entidades públicas no que diz respeito à ordem social, especialmente quanto a recuperação de viciados, drogados e delinquentes, e sempre conferindo maior fé à Bíblia sagrada como a Carta Magna de todo universo, e que é poderosa para salvar e transformar qualquer pecador (Rm 1.16; Tg 1.21).

Colaboração entre Igreja e Estado

Não obstante a separação, fato é que a Igreja deve contribuir com o Estado e a sociedade em geral, enquanto prega o Evangelho de paz, da justiça e da libertação, ressaltando a liberdade para que os homens foram criados e a dignidade de uma vida abundante proposta no Evangelho.

Veja-se, por exemplo, a própria Escola Dominical que tem funcionando como um poderoso instrumento de construção de cidadania, desde as suas origens na Inglaterra do século XVIII quando o jornalista inglês Robert Raikes, crente congregacional, resolveu fazer mais pela sociedade que imprimir notícias ou fazer trabalhos de ressocialização com presos nas cadeias.

O trabalho do irmão Raikes junto às crianças de Gloucester (Inglaterra), oferecendo a elas um pouco de civilidade e religiosidade, somado ao grande avivamento metodista (liderado pelos irmãos Wesley e pelo pregador do ar livre George Whitefield), contribuiu para salvar o seu país de uma terrível degradação moral e social. Não deve, em virtude de tal contribuição dada pela Igreja, o Estado, em contrapartida, ao menos viabilizar a liberdade da Igreja para realizar o seu trabalho?

Como diz o Pr. Antônio Gilberto, decano da Escola Dominical no Brasil, “A Escola Dominical também coopera eficazmente com o lar, na formação de hábitos cristãos legítimos, práticas e deveres sociais bíblicos, resultando na formação do caráter ideal, segundo princípios do genuíno cristianismo” (Antônio Gilberto, A escola dominical, 3 ed., CPAD, p. 9). Isso é ser sal da terra e luz do mundo!

Se por um lado, a política suja pode corromper um crente fraco, por outro lado, um crente justo e íntegro pode trazer saúde a uma política corrompida e enferma! Veja-se, por exemplo o caso de William Wilberforce, cujo legado foi deixado não só para a igreja, mas para o mundo!

William Wilberforce (24 de agosto de 1759 — 29 de julho de 1833) foi um político britânico, filantropo e líder do movimento abolicionista do tráfico negreiro. Começou sua carreira política em 1780 como candidato independente, sendo deputado do condado de Yorkshire entre 1784 e 1812.

Em 1785 converteu-se ao cristianismo e em 1787 conheceu Thomas Clarkson (abolicionista britânico) e um grupo abolicionista ao tráfico negreiro que incluía Granville Sharp, Hannah More e Charles Middleton, importantes nomes da época e que juntos persuadiram Wilberforce a entrar também na causa.

John Wesley, pregador inglês que já havia dado seu apoio ao movimento das escolas dominicais, também enviou cartas à Wilberforce dando seu apoio à causa abolicionista. Assim, Wilberfoce logo se destacou tornando-se líder do grupo britânico abolicionista, liderando uma campanha no parlamento inglês contra o tráfico de escravos que resultou, em 1807, na aprovação do Ato contra o Comércio de Escravos.

A liberdade e a dignidade humana dos negros africanos foram exaltadas pelo insistente compromisso daquele político cristão. Você pode assistir inclusive ao filme Jornada pela liberdade (ano: 2006, título original: Amazing Grace), que conta a história de luta deste parlamentar britânico contra o comércio de escravos. Há uma cena, que é uma das minhas preferidas, onde o grupo abolicionista está conversando com Wilberforce e lhe diz:

– Sr. William Wilberforce, sabemos que está tendo problemas em escolher se vai ficar a serviço de Deus ou a serviço da vida política. Nós humildemente sugerimos que faça as duas coisas.

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Casado, bacharel em teologia (Livre), evangelista da igreja Assembleia de Deus em Campina Grande-PB, administrador da página EBD Inteligente no Facebook e autor de quatro livros.

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