opinião
“Não dá para fazer nada. É assim mesmo”
O Brasil e a dissonância cognitiva
Dá-se o nome de dissonância cognitiva ao efeito, descoberto pelo eminente psicólogo Leon Festinger (1919-1989), em que se observa uma ação mediante um desencontro acerca do pensamento de um indivíduo com relação a algo que este saiba ou queira.
Exemplo: uma opinião qualquer, sobre determinado assunto, que o mesmo indivíduo é compelido a emitir de forma diferente, por um fator externo ou interno. Quando alguém vê algo que queira adquirir, por exemplo, mas sabe que não pode, terá uma reação pela dissonância cognitiva que se instaura, e que pode ir da depressão à indiferença.
Pois é, ao vermos a miríade de brasileiros que, com o advento da Internet, tem mais acesso à informação e pode verificar em outras fontes os desvarios e incoerências da grande mídia e dos seus respectivos governos, por exemplo, percebemos que nesta mesma miríade de pessoas acaba se desenvolvendo, em algum nível, um efeito de dissonância cognitiva, pela própria força dos eventos com que se depara.
Não podendo, em suas mentes, fazer nada para mudar a situação – o que é um erro de percepção -, então “adapta-se”, admitindo para si própria que a situação é “irreversível”, “não tem mais jeito”, “é assim mesmo”. Esta aceitação de uma realidade que se lhe impõe e é, em suas mentes, indestrutível, é a maior causa da derrocada civilizacional a que um povo já foi admitido. E tudo no Brasil parece ser assim, desde sempre.
Com o passar dos tempos, os efeitos em uma nação que age por “relação irrelevante” com os fenômenos com os quais se depara são os mais estranhos, não dando ela a devida atenção àquilo que é importante, justamente por que as mentes das pessoas aprenderam a se “acostumar” com o inverso, o controverso, o contrário.
Vão da prática da ação anormal, pela simples aceitação habitual de que “o errado é certo” e vice-versa, até à condenação da própria normalidade, o que passa a ser estranhado cada vez mais, como se o inconformismo com o grotesco, o errado, o avesso fosse, ele próprio, o grotesco, o errado e o avesso. É um fenômeno que, parece-me, só se vê, hoje, com esta intensidade, no Brasil. Não conheço nenhum outro lugar no mundo que possua estas características na civilização, de modo geral.
Na Igreja, isso também é uma realidade. Não nos esqueçamos, como friso sempre, que a Igreja brasileira é composta de brasileiros. Vemos, à medida em que os cristãos evangélicos brasileiros vão sendo absorvidos por um mundo rápido, volátil, supersônico, quântico, uma acomodação à situação atual, sob o pretexto de que precisamos fazer revisionismos quanto àquilo que a Bíblia diz e defende, haja vista ter sido escrita em uma época distante no tempo e no espaço de quase todo mundo que a segue.
Assim, por dissonância, os cristãos evangélicos brasileiros de mais leitura, que percebem a coisa toda um pouco mais rápido, são, curiosamente, os primeiros a se moldarem a um mundo que, segundo entendem, não tem mais espaço para “conservadorismos”.
Isto não é motivado por corações necessariamente maus, mas, por corações incautos, imagino. A necessidade da adaptabilidade ante um mundo tão volátil e que segue em rota de colisão consigo mesmo tem provocado as mais diversas consequências por dissonância e, em alguns casos, consequências grotescas. Não é de admirar que, em nome do amor e tolerância, tornem-se, de forma sarcástica e ácida, intolerantes e desamorosos. Com a prerrogativa da inclusão, excluem-se cada vez mais os discordantes. Sob o suposto escrutínio da espiritualidade bíblica “verdadeira”, admitem-se as mais vis e sórdidas práticas de libertinagem, ofensas à fé, distorções da Escritura, ao nível das blasfêmias, e tudo sob a égide de uma Igreja que “enxerga melhor as necessidades da atualidade do que as gerações passadas”. Nada poderia estar mais longe da verdade.
Sinceramente, como todo problema psíquico, a solução é psíquica. Ainda que o problema tenha graves consequências no físico (seja psicossomático), gerando uma sociedade literalmente doente, pois tem de, quase a todo momento, negar o que sabe ser o certo em nome de um sentimento, o erro, que ela própria não tem. Neste caso, a coisa toda passa pela alma do nosso povo, em cujo âmago está a mais profunda e simples necessidade de Deus. Não falo isso como um clichê, de jeito nenhum.
Falo como fruto de uma constatação ainda mais simples: por não entendermos “o caminho”, sentimo-nos inseguros, como Tomé, quando perguntou a Jesus sobre o caminho, em João 14:5.
Não ouvindo a resposta do Mestre, a confusão leva ao tipo de problema que mencionei no início: uma crise de identidade e ação, como que provocada pela mais forte e grave dissonância cognitiva.
O segredo? É este: a inabalabilidade da fé, pois a resposta que Jesus deu a Tomé continua valendo – “Disse-lhe Jesus: Eu Sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, senão por mim”, Jo. 14:6.
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