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O cristão deve estar na política para servir à sociedade, ensina pastor

Carlito Paes alerta para os perigos que o poder e a politicagem trazem aos cristãos

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Pastor Carlito Paes (Reprodução / Facebook)

“Eu me pergunto qual é a Bíblia que elas estão lendo”, afirmou o arcebispo sul-africano Desmond Tutu quando confrontado com a afirmação de que “religião e política não se misturam”.

Para o pastor Carlito Paes, “é inevitável que a igreja se envolva na política”. Salienta, contudo, que é preciso se manter longe da “politicagem”.

Paes pede bom senso e equilíbrio de líderes e pastores na relação com a política e lembra a importância de a igreja mostrar à sociedade aquilo que ela é a favor.

Em entrevista exclusiva ao Gospel Prime, o pastor sênior da Igreja Batista da Cidade, em São José dos Campos e líder da Rede Inspire falou sobre a relação da igreja, dos cristãos e dos pastores com a política.

Leia a íntegra da entrevista:

Como você vê a relação entre política e a igreja?

As igrejas estão nos municípios, na sociedade e no movimento do dia a dia das pessoas. Então, é inevitável que a igreja se envolva na política. Eu não vejo problema que a igreja se envolva na política. O que ela não deve é se envolver com a politicagem. Deve se manter distante.

A política em si é uma arte, é inerente a sociedade e excede as eleições e os partidos políticos. Mas, cada um tem que saber os limites entre a política e politicagem.

Eu lembro de uma frase do bispo sul-africano Desmond Tutu que diz que “não há nada mais político do que dizer que política e religião não se misturam”. Elas acabam se misturando e tudo está na essência do coração de cada um.

Eu penso que a relação entre política e igreja acontece naturalmente e nós devemos cuidar para não misturar política com partidos políticos e eleições. Misturar púlpito e palanque é pólvora na certa.

Pastores devem se posicionar politicamente? Se sim, até que ponto? Se não, por quê?

Todo pastor, antes de ser pastor, é cidadão. Então na sua vida pessoal, privada, ele tem todo o direito de expor suas filosofias, ideologias políticas e partidárias. Porque é pessoal.

Agora, usar do cargo para isso, é diferente. Inclusive, por lei, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) proíbe que ele, durante os serviços religiosos, manifeste opiniões políticas e partidárias na igreja, em especial no período eleitoral.

Cada pastor e líder, tem o direito de se posicionar, mas deve conhecer os limites dessa questão. Se souber fazê-lo de forma positiva, trará edificação.

Contudo, pastores não deveriam se candidatar. Porque para concorrer as eleições é necessário se filiar a um partido. E o nome já diz: partido. Ele deixa de ser pastor do todo para ser pastor que tem um partido. Se ele tem esse chamado, ele deve se licenciar da igreja e ser político.

Ser pastor de igreja e político ao mesmo tempo vai trazer conflitos de interesse. Nesse caso, está fadado a sair da política e entrar na politicagem.

Um político tem que votar pela orientação do partido, da sua bancada. Deve-se respeitar a fidelidade partidária, que muitas vezes é incompatível com a fidelidade às Escrituras e a missão da igreja.

A Igreja pode ser influenciada pela polarização política?

Os excessos de extrema-direita que estamos vivendo são um efeito colateral dos excessos de extrema-esquerda do passado. Os últimos governos do Brasil geraram uma milícia de esquerda muito forte. Um ativismo intolerante, não aberto a opiniões diferentes e ao diálogo.

E, assim, eclodiu num governo de direita que dentro dele tem elementos da extrema-direita.

Os extremos podem estar em lados diferentes, mas estão no mesmo nível. No mesmo nível em falta de paciência, de diálogo, de harmonia e intolerância com quem pensa diferente.

Onde está os extremos é onde está o perigo. A segurança mora no equilíbrio. O avião voa com duas asas. O desequilíbrio pode matar uma pessoa e uma boa ideia.

O momento do governo agora tem sido prejudicado por movimentos extremos. Dureza gera dureza, violência gera violência, mas precisamos voltar a sanidade, porque gentileza gera gentileza.

A maioria das bandeiras defendidas pelos cristãos se encontra à direita do espectro político. Como lidar com esta questão sem politizar a fé?

Esse é um ponto muito importante. A maioria das bandeiras dos cristãos; contra o aborto, pela família, propriedade privada, liberdade religiosa e de expressão, herança judaico-cristã, foi colocada como sendo bandeira da direita, mas não é. É bandeira da vida, da ética. Como também o combate ao racismo não é uma bandeira da esquerda, é uma bandeira da vida, do evangelho.

Nós temos que colocar Jesus no centro e precisamos das bandeiras corretas. Nós temos hoje muitos cristãos e pastores de direita que não falam de justiça social, do pobre, da igualdade, do direito, da liberdade. E isso acaba gerando um pertencimento de bandeiras que na verdade são pautas de Cristo e do evangelho. Por isso, temos que trabalhar nessa perspectiva.

Rick Warren diz que a igreja levantou tanto “não, não, não”, que a sociedade hoje sabe o que a igreja é contra, mas não sabe o que a igreja é a favor.

Está na hora da igreja se levantar a favor da vida, da ética, do amor e contra o bullying, racismo, extremismo e corrupção. Essas continuam sendo grandes bandeiras de quem segue a Jesus, independente de esquerda ou direita.

Nós temos que cuidar para não politizar a fé, que em Jesus, é mandamento, não política.

Carlito Paes (Reprodução / Facebook)

Governo (política) é uma das sete áreas de influência, como cristãos vão escalar esse monte sem se sujar? Como promover mudanças num ambiente com tanta opressão?

É inevitável que a sociedade precise de cidadania. E a cidadania deve ser exercida pela igreja também. A igreja deve entender que deve estar no governo para servir, não pelo poder.

Quando um cristão acha que vai escalar os sete montes para conquistar o poder, ele tem que participar da política partidária, ele tem que ter cargo no governo e ser parte do poder. Aí ele já se sujou.

A cidadania se exerce sem partido, sem cargo e sem comissão e salários do governo. Isso gera mais liberdade. A igreja deve estar onde as pessoas estão, e, para isso, ela não precisa de cargos, mandatos ou recursos do governo.

Uma maneira de se promover mudanças sem cair na corrupção é não receber benefícios. Não é uma função no governo que vai fazer a coisa mais importante do país acontecer.

Uma vez perguntarem a Rick Warren, depois que ele orou na posse de Barack Obama, se ele se candidataria a um cargo político. Ele respondeu que não aceitaria um cargo de menor posição que ser pastor.

Todo pastor deve servir a sociedade, deve estar disponível para ouvir e atender o que a igreja pode fazer pelo município, estado ou país. Mas ele não precisa de cargos, salários ou ser membro do governo. Tudo isso são coisas circunstanciais.

Pastores podem ser uma benção sendo voz de consciência, voz profética e pastoral na vida de políticos, não apoiando seus erros, mas sendo instrumentos de amor, justiça e verdade! Quem quer ser político para influenciar, está insatisfeito ou desmerecendo o chamado pastoral, e isto é ruim, porque entrará para política pela motivação errada!

Um pastor tem uma influência, que não é de 4 anos, um mandato via um chamado. A igreja vai existir independente de qualquer mandato. Eu sou pastor de uma igreja de quase 80 anos. Entra governo e sai governo e ela continua com seu mandato cultural, redentor na sociedade, servindo eticamente.

Eu espero que Deus levante muitos cristãos com visão de servir na política, mas não com visão de escalar o poder.

A Igreja brasileira está politizada? Qual solução e posicionamento ela deve tomar?

Sim, acredito que a igreja brasileira está bem politizada. Não sei dizer o quanto disso é saudável e isso é uma consequência do crescimento. Embora a igreja tenha 150 anos de Brasil, só agora chegou aos 30% da população.

Nós temos cristãos presentes em todos os segmentos da sociedade. A igreja está presente no teatro, nas artes, no esporte, na mídia e também na política, é natural.

Em particular, nessas últimas eleições, devido as bandeiras do governo federal, houve um grande apoio por parte de pastores e igrejas evangélicas para uma antítese do que propunha o PT. Não sei como ficará as coisas para as próximas eleições.

Precisamos entender que as coisas têm que ser corretas e feitas da maneira correta, mas com o andar da carruagem eu não sei como será o futuro. Até pela questão do “Centrão” dentro do governo, que era uma prática que não foi esperada nem prometida durante a campanha e hoje é uma realidade.

A igreja está mais politizada sim, mas não uma coisa que aconteceu nesse governo. Vem numa crescente como vem crescendo o número de evangélicos no país. Como será as próximas eleições? Não sei. Os cristãos precisam de muita sabedoria, discernimento e oração.

Mas do que nunca não devemos entrar em bola dividida. Pastores devem fazer seu trabalho pastoral, porque os políticos não farão esse trabalho. Estamos saindo de uma pandemia depois de 80 dias e não estamos saindo porque os índices estão diminuindo. Ainda estamos num crescente de infecção e de morte, ainda que tenhamos um grande número de recuperações.

Temos que ser sábios porque ainda tem muita gente morrendo e se contaminando. Vivemos num país de extrema desigualdade social e o inverno ainda não chegou. Temos que ficar de olho na saúde, também no mercado e na economia.

A volta das igrejas deve ser gradativa com observação das estatísticas. Os pastores devem orar e analisar tudo muito bem. Continuar sendo contra a corrupção, violência, racismo e os extremismos.

Buscar bom senso e sabedoria, mesmo que sejam atacados ou rotulados de isentões. Eu prefiro chamar de bom senso e equilíbrio. Porque Jesus salva, mas o bom senso é escolha de cada um de nós.

Tem muito pastor sem noção, ou extremamente ativo na ideologia de esquerda ou direita e não consegue analisar as coisas a partir do bom senso, do que é certo e errado à luz do evangelho.

Que a nossa posição final seja sempre pela verdade, por Jesus e pelo Evangelho.

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