opinião
Karen-haters: a caça às bruxas dos tempos modernos
Onde estão as feministas agora?
A noite de 30 de Junho seria longa. Corria o ano de 1934. Na Alemanha Nazi, a facção do Partido Nazista afecta a Adolf Hitler, estava ávida de mais poder. Rapidamente foram executadas várias expurgas políticas extrajudiciais. Conservadores antinazis, foram mortos sem dó nem piedade. 85 no total.
Na madrugada do dia 1 de Julho de 1934, Hitler prendeu Ernst Röhm, seu amigo e aliado, chefe das SA, num hotel de Munique. Resistindo, foi levado para o cárcere onde lhe deram uma pistola e uma bala, com 10 minutos para se suicidar. Röhm recusou-se dizendo: “Se vou ser morto que seja o Sr. Hitler a fazê-lo”. Executaram-no com um tiro à queima-roupa. Foi a noite das facas longas!
Corre o ano de 2020 e uma das tendências mais populares na Internet é a humilhação ritualista de mulheres. Especificamente, mulheres brancas, geralmente de meia-idade. São chamadas de “Karens”. E o ódio por elas está fora de controle. Tornou-se um desporto sanguinolento. (O uso do nome Karen como um insulto teve origem nos Estados Unidos para descrever mulheres de baixo estatuto social que têm cortes de cabelo antiquados – uma espécie de penteado de capacete – e que adoram dizer “quero falar com o gerente”. É um preconceito feio, por parte da esquerda progressista.)
As multidões dos supostamente virtuosos amam acima de tudo caçar estas mulheres, filmá-las, colocar o conteúdo online, e depois sentar-se e ver as vidas dessas mulheres serem destruídas por exércitos de “Karen-haters”. As mulheres perdem os seus empregos, escondem-se, emitem denúncias desesperadas, numa tentativa de salvar um pouco da sua reputação. De nada vale.
É a caça às bruxas dos tempos modernos. Quem não está alinhado totalmente com a agenda progressista, mesmo sendo mulher e feminista, é expurgado da sociedade. As facas longas são desembainhadas e toca a cortar.
A última bruxa a ser ritualisticamente humilhada pelos generais KH “Karen-haters” é conhecida apenas como Leah. A sua humilhação pública e ritualista teve lugar em Seattle quando um homem negro chamado Karlos Dillard seguiu a mulher até sua casa depois de alegadamente terem tido uma discussão no trânsito.
Dillard diz que Leah lhe mostrou o dedo do meio e chamou-lhe “preto”. Leah diz que isso não aconteceu e que é uma mentira total. Mais tarde revelou-se que este homem tem um histórico de caçar “Karens” e acusá-las de dizerem coisas que não disseram. O seu hobby é humilhar e filmar mulheres brancas que ele provoca.
O vídeo é de difícil visualização e é perturbador. (procurem na net, não tenho coragem de colocar aqui o link!) A mulher está incrivelmente angustiada. Ela treme e chora enquanto Dillard a filma e a humilha. O que torna o vídeo ainda mais arrepiante é ver que esta mulher – ao contrário de algumas das “Karens” anteriormente apanhados – sabe exactamente o que está a acontecer.
Ela sabe que está a ser nomeada e envergonhada como bruxa e que a sua vida pode desmoronar-se completamente. “Sou uma Karen”, ela chora enquanto cobre a matrícula do seu carro num esforço desesperado para permanecer anónima e proteger-se do assédio em massa, ameaças de violência e potencial perda de emprego que se seguem sempre à exposição de uma bruxa, nas redes sociais. Estamos a testemunhar uma mulher a lutar pela sua própria vida.
Apenas algumas considerações sobre este triste caso (Mas há mais: Recentemente duas meninas Lotte e Amelia, num vídeo popular da BBC, disseram que as mulheres para não serem “Karens”, devem ler bastante, não devem “ser defensivas sobre a sua branquitude” e devem “pensar seriamente sobre a sua identidade branca e seus privilégios”. “Saiam da frente” aconselharam elas, e “desapareçam”, acrescentaram, enquanto riam. Também recentemente, uma professora universitária foi acusada de racista por parecer que estava a cochilar no Zoom, durante uma reunião de combate ao racismo. Já há um abaixo-assinado pedindo a cabeça da professora.)
A dinâmica do poder no vídeo é impressionante.
Os novos racialistas da esquerda regressiva e do movimento identitário, querem que acreditemos que a mulher branca tem todo o poder. Ela está mais acima do que o homem negro nas listas ridículas de identidade, politicamente analfabetas e que indicam a classe, nas quais todos os grupos raciais e de género são ordenados de acordo com o facto de serem privilegiados (maus) ou oprimidos (bons). Mesmo, o facto da mulher estar a chorar é considerado como prova do seu privilégio e poder.
Ela está, segundo os novos regressivos, a usar as suas “lágrimas de mulher branca” para assinalar o seu domínio sobre um homem negro que apenas quer justiça pelo facto de, alegadamente, lhe terem mostrado um dedo. Isto é um disparate completo e qualquer pessoa que ainda conserve um resquício de bom senso sabe disso.
O poder neste vídeo arrepiante reside inteiramente no homem que empunha o seu iphone como um instrumento de humilhação, de vergonha pública, semelhante a uma faca longa. Era o mesmo que acontecia quando na Idade Média se apontava um dedo a uma mulher acusando-a: “Vi-a a dar cambalhotas com o diabo”. Isto é sinistro. Vindo duma esquerda que deseja defender o estatuto da mulher é criminoso. Onde estão as feministas agora?
Outra questão é de onde os generais KH “Karen-haters” derivam o seu poder.
Vem do apetite insaciável entre os reaccionários identitários por falantes ou pensadores que eles possam denunciar e destruir ritualisticamente. Pessoas que não alinham totalmente com a sua agenda revolucionária. É este apetite distorcido dos meios de comunicação social por espectáculos de vergonha que leva à destruição duma pessoa alegadamente má, que reforça e dá poder a pessoas como Dillard. Um bárbaro vitual!
É relatado que ele tem uma estranha obsessão por Karens e até está a vender t-shirts anti-Karen através da sua página no Instagram. O “Karen-hatismo” tornou-se uma espécie de indústria. Há memes, há roupa de marca, e há, naturalmente, os vídeos de “Karens”, expostas e estilhaçadas, que são vistos e partilhados milhões de vezes. Dillard conseguiu reduzir Leah a um farrapo choroso. Para ela restou-lhe a tentativa desesperada de permanecer anónima em meio a esta cultura bacoca e misógina que procura mulheres brancas para injuriar e derrubar.
Uma das ironias desta caça às bruxas de “Karens” é que as pessoas que envergonham as mulheres são muito mais semelhantes às “Karens” do que as mulheres que humilham.
O preconceito de “Karen” é construído sobre uma visão de que certas mulheres brancas de classe média, de meia-idade, são rudes e arrogantes e dadas a reclamar. Elas querem sempre “falar com o gerente”.
Mas são os generais desta brigada anti-mulher que mais desejam “falar com o gerente”. A sua missão na vida, é denunciar as pessoas “problemáticas” aos gestores da nova justiça social, aos chefes do anti-patriarcado e do anti-privilégio branco, às novas elites do politicamente correcto.
A sua sede em destruir mulheres, por fazerem ou dizerem algo errado, ofusca totalmente o instinto de sobrevivência dessas mulheres brancas. A noite das facas longas está aí. E vai ser uma noite longa!
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