cultura
Sistema carcerário: a dura realidade que poucos veem
Resenha sobre o livro “Estação Carandiru”.
Justiça ou Vingança?
Nesse terceiro e último artigo a versar sobre o sistema carcerário brasileiro, ventilarei algumas reflexões sobre o anseio geral da população, mormente quanto à necessária distinção entre Justiça e Vingança.
A bem da verdade, falar sobre o sistema carcerário aflora às emoções dos leitores conceitos e opiniões pré-concebidos que, não raramente, impedem que o tema seja refletido à luz de sua indubitável complexidade.
Sem singrar pelas diversas facetas do tema, desejo, em apertadas linhas, discorrer e refletir sobre o que realmente desejamos àqueles que cumprem pena pelos crimes cometidos: afinal, o que queremos? Justiça ou Vingança?
Ora, há uma grande diferença entre esses dois conceitos. A primeira requer obediência à regra posta pela lei, conformismo com a ação do Estado e proibição da “justiça com as próprias mãos”. Já a segunda traz em seu cerne o exercício das próprias faculdades sem que se deva observar qualquer regra ou ordenamento jurídico vigente.
Quando ouço argumentos provenientes de pulmões cheios e olhos pulsantes que proclamam: “todo castigo para preso é pouco” ou “tem que sofrer mesmo”, ou ainda “o pai de família não tem nenhum regalia e esses safados querem ter”, eu vejo um completo desconhecimento do que vem a ser o sistema carcerário.
Talvez a melhor forma de entender determinado segmento da sociedade, qualquer que seja ele, se dê pelo exercício da alteridade, ou seja, o exercício de se colocar no lugar do outro. Como você gostaria de ser tratado se fosse preso? Daí vem a máxima: eu não sou bandido, nunca fiz nada de errado. Será mesmo?
Vamos fazer aqui um pequeno exercício: você já comprou CD ou DVD pirata? Já compartilhou PDF’s de obras literárias sem autorização do autor? Já arremessou ou derramou em via pública, ou em lugar de uso comum, ou do uso alheio, coisa que possa ofender, sujar ou molestar alguém (art. 37, da Lei de Contravenções Penais)? Entregou-se habitualmente à ociosidade, sendo válido para o trabalho, sem ter renda que lhe assegure meios bastantes de subsistência (art. 59, da Lei de Contravenções Penais)?
Pois bem, se já cometeu alguma das condutas acima, então você também já cometeu um ilícito penal. A questão é: como você gostaria de ser tratado na prisão?
Talvez você responda: ah, mas nunca matei, nem roubei, nem estuprei. Glória a Deus por isso. A questão que quero refletir, e espero que você também reflita, é que a distinção entre os crimes deve ser efetivada na dosimetria da pena, e não em maior ou menor incidência de maus tratos ao preso.
Veja, se entendemos que a pena mínima de 6 anos para quem comete o crime de homicídio é muito curta (como eu acho), e que ao cumprir 1/6 da pena o preso já pode progredir para o regime semiaberto, a solução perpassa pelo aumento da pena e não pela defesa de maus tratos na prisão.
Se você pensa que o crime de estupro de vulnerável está dentre os crimes mais cruéis e abjetos que existem e que a pena base de 8 anos é baixa (como eu acho), a solução também está no recrudescimento da pena e na aplicação de um percentual maior de cumprimento da pena para progressão de regime (eu, particularmente, defendo a prisão perpétua para esse crime).
Veja, essa é a diferença entre Justiça e Vingança. Nós, como cristãos e povo de Deus, não podemos defender a vingança, mas podemos e devemos lutar por Justiça. O cumprimento das penas impostas pela lei também é uma forma de exercício do poder de Deus, já que as autoridades foram por Ele constituídas.
Quando defendemos que presos tomem choque elétrico, passem fome, durmam em ambientes cheios de sarna, baratas e muquiranas, não estamos discursando em favor da Justiça, mas sim em favor da vingança.
Em nenhum momento estou a defender a impunidade ou que presos não paguem pelo que fizeram. Agora não posso, como cristão, chancelar a vingança, os maus tratos e a crueldade humana travestida de justiça. Que paguem com penas duras pelos crimes cometidos, mas que não sejam vilipendiados assim como eles mesmos fizeram com suas vítimas; doutro modo, tornar-nos-íamos iguais a eles!
Não é despiciendo lembrar que a própria Lei de Deus se preocupou com um julgamento justo. À época de Moisés, Deus instituiu 6 cidades de refúgio àqueles que matavam alguém sem intenção de matar, de modo que, nessas cidades, não sofressem vingança dos familiares da vítima. Após isso, seriam julgados por um Juiz natural (Moisés ou alguém por ele autorizado) e, somente após isso, a pena seria cumprida. Constata-se, portanto, que Deus chancela e autoriza a Justiça, mas não a vingança.
Por fim, podemos dizer que a vingança pode ocorrer tanto antes do julgamento como depois dele, sendo, neste último caso, o mais defendido pelas pessoas, ou seja, quanto mais o preso sofrer, melhor.
Que possamos ser cristãos autênticos; que possamos seguir os valores da Palavra de Deus e, por fim, que não sejamos “meros reprodutores de música urbana”, repetindo o que todo mundo fala sem o necessário cotejo com a Palavra de Deus.
Que Jesus te abençoe grandemente!
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