estudos bíblicos
Salvação – O amor e a misericórdia de Deus
Subsídio para a Escola Bíblica Dominical da Lição 4 do trimestre sobre “A obra da salvação”
3 – Amor, bondade e compaixão na prática
Deus possui muitos atributos, “características que podem ser atribuídas à natureza de Deus – uma característica essencial de Deus”(17). Alguns desses atributos são incomunicáveis (por exemplo, onipotência, onisciência, onipresença, etc.), e outros são comunicáveis (por exemplo, amor, santidade, bondade, justiça, verdade, etc.). Incomunicáveis são aqueles que Deus não comunica às suas criaturas, ou seja, não reparte com elas. Comunicáveis sãos os atributos morais que Deus compartilha com suas criaturas, dando a elas porções suficientes destas virtudes para modelar-lhes o caráter. É aqui que se encaixam amor, bondade e compaixão
Por Deus ter nos amado sendo nós ainda pecadores, não temos direito de negar amor mesmo aos que ainda estão perdidos, nem mesmo aos nossos inimigos, antes, mesmo para com eles, devemos ser misericordiosos, pois todos nós estávamos em inimizade contra Deus quando Ele mirou seu olhar de compaixão e misericórdia na nossa direção. Amor é uma dívida que pagamos todo dia e nunca saldamos totalmente! (Rm 13.8: “Não devam nada a ninguém, a não ser o amor de uns pelos outros…”, NVI).
- Quem recebeu misericórdia, dá misericórdia!
Há uma parábola nos evangelhos que deve levar-nos a refletir seriamente sobre a necessidade de agirmos com misericórdia uns para com os outros, visto que Deus é misericordioso para com todos. É a parábola do credor incompassivo (ARC) ou do servo impiedoso (NVI), registrada em Mateus 18.23-35.
Um certo homem devia dez mil talentos ao seu rei, onde cada talento valia cerca de seis mil denários, ou seja, seis mil dias úteis de trabalho (um só talento já valia a renda quase uma vida inteira de trabalho, imagina dez mil!)(18). O rei pediu contas dessa dívida, mas evidentemente o seu servo não podia lhe pagar, visto que já somava um total de 60 MILHÕES DE DENÁRIOS! (talvez você ache um exagero esta dívida, mas lembre-se que Jesus talvez esteja exagerando numericamente com o propósito de realçar a natureza imensurável da nossa dívida para com Deus). O servo, sentido a miséria do castigo que sofreria sob a ordem do rei, suplica-lhe por misericórdia e paciência, ainda que lhe fazendo uma promessa impossível de ser cumprida: “tudo te pagarei” (Mt 18.26). A declaração que se segue revela o coração de Deus em nosso favor: “Então, o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida”. Quem poderia pagar pelo perdão de seus pecados? Quem poderia remir ao seu irmão ou dar a Deus o valor pelo resgate de sua alma? “o resgate de uma vida não tem preço. Não há pagamento que o livre” (Sl 49.8, NVI). Então Deus nos perdoou em Cristo e por causa de Cristo. Mas voltemos a parábola: o que o servo, agora com sua dívida perdoada por compaixão de seu rei, o que ele faz? Encontra-se com seu conservo que lhe devia um valor irrisório se comparado com sua própria dívida com o rei: apenas cem denários. E qual a atitude dele em relação a este conservo? Compreensão? Paciência? Longanimidade? Perdão? Não! “Agarrou-o e começou a sufocá-lo, dizendo: ‘Pague-me o que me deve!’” (Mt 18.28, NVI). O conservo demonstrou mesma contrição que o servo outrora havia demonstrado diante do rei, mas o servo não teve qualquer compaixão, apesar de ter recebido compaixão antes. Então o que fez? Mandou prender o conservo até que pagasse a dívida! Agora veja: o homem que teve a dívida de 60 MILHÕES DE DENÁRIOS perdoada, não teve qualquer piedade de outro homem que devia a ele míseros 100 denários! Quando o rei soube desta atitude truculenta e impiedosa do servo, não deixou barato: reabriu a dívida dos 60 milhões de denários, entregou o servo aos “atormentadores” (conforme Robertson, “Não simplesmente para prisão, mas para o castigo terrível”), até que tudo pagasse (“essa condenação não é purificadora, mas punitiva, porque ele jamais conseguiria pagar a dívida imensa”)(19). Cristo finalizou a moral da história: “Assim vos fará também meu Pai celestial, se do coração não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas”.
Claro que este texto não é um dogma para perdão de dívidas financeiras. O contexto trata de misericórdia para com o irmão que nos ofendeu e buscou a reconciliação.
Perdoar é um ato de misericórdia, pelo qual eu liberto meu irmão que está na aflição da culpa e do medo pelo erro cometido contra mim. O amor, diz Paulo, “Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1Co 13.7)
- Amor, bondade e misericórdia sendo testados
De modo prático, diariamente somos convidados por Deus a manifestar amor e misericórdia:
- No trato amoroso, tolerante e paciente com o cônjuge
- Na correção moderada dos filhos que erram
- No relacionamento com os amigos de empresa, especialmente aqueles que interferem em nosso trabalho ou intentam contra nossa reputação
- Na tolerância com os irmãos mais fracos da igreja
- Na notícia que recebemos de um irmão acidentado ou com graves problemas financeiros
- Numa conversa sincera e equilibrada com um vizinho incômodo
- Na repreensão de um liderado que está prejudicando o trabalho do grupo
- Na cobrança de uma dívida, especialmente quando nós também somos devedores a outros
- Numa exposição doutrinária na igreja, para que a pregação não se converta em discurso de ódio (as famosas “pregações de carapuça”)
- O cachorro que não para de latir, o carro de um estranho bem à frente da nossa garagem, o espertinho que tomou nossa frente na fila do banco, a mãe que carrega sua filha nos braços pedindo-nos uma esmola, dentre muitas outras situações, são alguns exemplos de como nosso amor, bondade, compaixão e misericórdia são testados todos os dias!
Nestas situações, somos aprovados ou reprovados?
Como Deus tem sido misericordioso conosco, socorrendo-nos em meio aos sofrimentos, façamo-nos um abrigo para os que jazem em dores! Aliás, não é este um bom momento para pedirmos a Deus os dons de socorro e misericórdia? (Rm 12.8; 1Co 12.28). Se quisermos ser reconhecidos como verdadeiros discípulos de Cristo, não será pelo nosso discurso, mas pelo amor! “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13.35). Esta é a lei do reino de Deus (Tg 2.8). Bondade é fruto do Espírito, o caráter de Cristo gerado em nós (Gl 5.22). Se quisermos ser de fato reconhecidos como cristãos, ajamos como Cristo! Imitemos Cristo! Busquemos o caráter de Cristo!
Que a aula deste domingo sirva para fazer-nos refletir em como Deus nos amou, e como nos tornamos, em virtude da grandeza deste amor, devedores de Deus e dos homens. E que cravemos no nosso coração esta bem-aventurança do cristão:
“Bem-aventurados os misericordiosos, pois obterão misericórdia” (Mt 5.7)
Deus te abençoe!
REFERÊNCIAS:
- William Hendricksen. Comentário do Novo Testamento – exposição do Evangelho de João, Cultura Cristão, p. 190
- Tiago Rosas. A mensagem da cruz: o amor que nos redimiu da ira, Leve, p. 54
- Craig Keener. Comentário Bíblico Atos: Novo Testamento, Atos, p. 280
- D. A. Carson. O comentário de João, Shedd Publicações, p. 205. Grifo meu
- John Piper. Disponível em: desiringgod.org/messages/god-so-loved-the-world-part-1. Acessado em 19/10/2017. No original inglês, incluindo as partes suprimidas no artigo acima, Piper diz >> “For God so loved the world . . .” The most common meaning for world in John is the created and fallen totality of mankind. John 7:7: “The world cannot hate you, but it hates me because I testify about it that its works are evil.” John 14:17: “. . . the Spirit of truth, whom the world cannot receive, because it neither sees him nor knows him That is the way John is using world here. It is the great mass of fallen humanity that needs salvation. It’s the countless number of perishing people from whom the “whoevers” come in the second part of the verse: “. . . that whoever believes in him should not perish.” The world is the great ocean of perishing sinners from whom the whoever comes << Claro que como bom calvinista que é, Piper precisará depois explicar, contraditoriamente, que este amor com que Deus amou o mundo não é o mesmo amor redentivo e irresistível dirigido aos eleitos. Mas é justamente de amor salvífico que João 3.16 está falando! Não há outro amor salvífico fora deste ágape de Deus que está expresso em João 3.16. É justamente aí que está a expressão máxima do amor de Deus. Por todos os pecadores, como Piper acertadamente afirmou.
- Craig Keener. op. cit., p.280
- Franklin Ferreira. Vídeo no Youtube intitulado “Franklin Ferreira – Deus amou TODO o mundo? (João 3:16)”. Disponível aqui: https://www.youtube.com/watch?v=5DEDUpJK-H4. Acessado em 19/10/2017
- D. A. Carson. Op. cit., p. 206
- D. A. Carson. Op. cit., p. 207
- Tiago Rosas. Op. cit., p. 53
- William Menzies e Stanley Horton. Doutrinas Bíblicas – os fundamentos da nossa fé, CPAD, p. 41
- Lawrence O. Richards. Guia do Leitor da Bíblia, 8. ed., CPAD, p. 27
- Hogg e Vine, citados em Dicionário Vine, 7. ed., CPAD, pp. 793-4
- Novo Dicionário de Teologia Bíblica, Vida, p. 944
- Jacó Armínio. As Obras de Armínio, vol. 1, CPAD, p. 266
- John Wesley. Romanos: notas explicativas, CEDRO, p. 8
- Norman Geisler. Teologia Sistemática, vol. 1, CPAD, p. 559
- T. Robertson. Comentário Mateus e Marcos à luz do Novo Testamento Grego, CPAD, p. 209. Robertson comenta: “Um talento era o valor equivalente a seis mil denários, o que equivalia a seis mil dias úteis de trabalho ou trinta anos de trabalho”
- T. Robertson. Op. cit., pp., 210-1
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